domingo, 8 de janeiro de 2023

2023 Renault e-Kwid Intense "E-Tech" EV; o caro que sai barato

Iniciamos a temporada 2023 de avaliações com este que é um dos elétricos mais baratos do Brasil. Testamos a novidade por uma semana.

Texto e fotos por Yuri Ravitz
Modelo cedido por Renault do Brasil

Nosso exemplar veio na cor Branco Polar, a única que não tem custo adicional.

Quem acompanha o Volta Rápida há mais tempo já sabe que carros 100% elétricos podem ser estupidamente divertidos e, em alguns casos, um bom negócio do ponto de vista econômico. Não é para menos: até agora, nossas avaliações com veículos desse tipo contemplaram apenas modelos voltados ao público premium, inacessíveis para a grande maioria da população e recheados de recursos tecnológicos, além de oferecerem desempenho muito acima de qualquer carro que possa ser considerado "normal".

Foi tudo lindo e maravilhoso, porém, a grande dúvida que compartilhávamos com nossos leitores é: será que um modelo elétrico normal e relativamente "acessível" consegue ser igualmente interessante no uso diário? Felizmente, conseguimos iniciar 2023 respondendo a essa pergunta através do Renault e-Kwid, versão 100% elétrica do subcompacto que já avaliamos em três ocasiões: 2017, 2019 e 2022. Ele tem sido tratado no Brasil como Kwid E-Tech, nome que a marca quer usar para simbolizar sua nova fase eletrificada em nosso país.

Emblemas E-Tech na traseira e laterais, além da letra E antes do nome Kwid, destacam o subcompacto.

E de Experiência

Importado da China, o e-Kwid é a variante mais cara do Kwid e um dos elétricos mais baratos do Brasil; pelo preço único de R$146.990, ele se posiciona acima do JAC E-JS1 que custa R$145.900 e abaixo do CAOA Chery iCar que sai por R$149.990. Dentro da Renault, ele custa quase 100 mil reais a menos do que o veterano Zoe, ainda oferecido em nosso país, mas, esquecido pelo público e o mercado em geral. Com o e-Kwid, a montadora quer mudar esse cenário, aproveitando a experiência adquirida com erros do passado para acertar no presente e pavimentar o caminho para o futuro; vale lembrar que o novo Megane E-Tech chegará em solo tupiniquim agora em 2023.

Além de ser importado, enquanto as outras versões com motor a combustão são fabricadas aqui, o e-Kwid se diferencia do Kwid convencional por outros fatores. Ele traz discretas diferenças visuais tanto no exterior quanto no interior, além de contar com rodas de quatro parafusos ao invés das polêmicas peças de três furos, medida adotada por conta, principalmente, do peso total do pequeno elétrico - no mínimo, mais de 150kg de discrepância em relação ao Kwid convencional, com o modelo elétrico beirando 1 tonelada. Por fim, a proposta também é bem distinta: o e-Kwid foi projetado para uso prioritariamente urbano, enquanto que o convencional atende a mais possíveis cenários de convívio.

Debaixo do capô do e-Kwid, cabos e componentes integrados em um ambiente um tanto "cyberpunk".

Um clichê eletrizante

O e-Kwid é movido por um motor elétrico montado no eixo dianteiro, capaz de entregar até 65cv e 11,5kgfm de potência e torque máximos. É um pouco menos de pico de potência e um pouco mais de pico de torque em relação ao 1.0 SCe do Kwid convencional, o que pode frustrar muitos possíveis compradores antes de um test-drive no mundo real; sendo um elétrico, é importante lembrar que esses números são entregues de maneira imediata assim que pressionamos o acelerador ao máximo. É claro que o e-Kwid passa longe de ser um esportivo, mas, acredite: nas saídas mais apressadas, o subcompacto consegue até dar um certo "coice" nos ocupantes que nos faz duvidar da ficha técnica, resgatando o clichê do menos é mais.

Para alimentar o motor elétrico, uma bateria de 26,8kWh montada no assoalho promete, segundo números oficiais da marca, uma autonomia de até 298km em ciclo unicamente urbano e 265km em ciclo combinado - o alcance é menor em uso rodoviário por dois motivos: a velocidade mais alta que é mantida durante a condução e a incidência menor de frenagens que, no uso urbano, ajudam a repor uma parte da energia, auxiliando na autonomia total. No resumo da ópera, o e-Kwid se mostra muito mais esperto do que o Kwid convencional no ambiente urbano, entretanto, o modelo flex se comporta melhor nas estradas, reforçando a distinção de proposta e de público-alvo entre eles.

Por dentro, o e-Kwid traz volante, multimídia e painel de instrumentos diferentes do Kwid convencional.

Só mais um pouquinho

O e-Kwid é vendido em versão única no Brasil, sem opcionais. A lista de itens de série contempla: luzes diurnas em LED, painel de instrumentos com mostradores digitais, controle de estabilidade com assistente de partida em rampas, retrovisores externos com ajustes elétricos, bancos em couro, lanternas com luzes de posição em LED, monitoramento de pressão dos pneus, câmera de ré, ar condicionado, central multimídia com tela de 7 polegadas, entre outros.

Para ajudar a explicar seu preço, o e-Kwid traz alguns recursos inexistentes nos demais: seis airbags (os dois a mais são de cortina), sensores traseiros de estacionamento, direção elétrica, ajuste de altura dos faróis, vidros elétricos nas quatro portas, repetidores de seta em LED nos retrovisores e limitador de velocidade. Por dentro, um volante exclusivo e partes do acabamento em cinza mais claro deixam o ambiente um pouco mais bonito, porém, ainda pobre para um carro de quase 150 mil reais pelo excesso de plástico por todos os lados.

Além disso, algumas pobrezas do Kwid convencional não foram deixadas de lado aqui: só há dois alto-falantes de qualidade sonora questionável na dianteira, rodas aro 14 de ferro cobertas por calotas que simulam aros diamantados e uma única porta USB para os ocupantes da frente. Por fim, não há comandos de multimídia na coluna de direção (embora o Kwid convencional tenha recebido no facelift) e a central multimídia é uma velha conhecida: é o mesmo Media Nav Evolution de meados de 2014/2015, mas sem a parte do "Nav" porque não há GPS nativo. Seriam faltas até perdoáveis nas versões comuns por conta do preço, mas, não no e-Kwid.

Tomada de recarga fica na dianteira, protegida pelo acabamento da "grade" entre os faróis.

Céu, mato e um pouco de concreto

Rodamos 600km com o e-Kwid ao longo de nossa semana de testes, priorizando trechos rodoviários justamente para analisar como o subcompacto se comporta fora do seu ambiente originalmente planejado. Além disso, não utilizamos o modo ECO em momento algum, recurso que adota medidas para diminuir o consumo de energia como, por exemplo, reduzir a força do ar condicionado e a sensibilidade do acelerador, além de limitar ainda mais a velocidade máxima para algo em torno dos 110km/h; sem o modo ECO, a máxima é limitada eletronicamente em 130km/h para não acabar com a bateria rápido demais.

Começando pelo primeiro contato, o e-Kwid é extremamente discreto e só os mais atentos notarão as diferenças entre ele e o convencional: além da já citada grade dianteira, adesivos nas laterais e emblemas na traseira decoram a versão elétrica, além de pequenos detalhes em dourado abaixo dos faróis. Os aros, na verdade, são calotas que simulam um acabamento diamantado e cobrem as verdadeiras rodas em ferro, escondidas por trás do preto brilhante das coberturas. Os apliques de teto que simulam bases para rack continuam sendo meramente decorativos.

As medidas do e-Kwid são exatamente as mesmas do convencional.

Destravado o carro, o ambiente interno é quase o mesmo do Kwid convencional, mas, até consegue passar um "ar" levemente diferenciado. Para ligá-lo, como nos comuns, é preciso inserir a chave à direita do volante e virá-la duas vezes - uma para o modo acessório e a outra para, de fato, dar a partida. Não há qualquer barulho, apenas uma animação de check-up no painel de instrumentos e um pequeno OK verde que se mantém aceso enquanto o carro estiver ligado, indicando que está pronto para ser conduzido. 

Inclusive, caso a porta seja aberta, o próprio e-Kwid avisa por alertas sonoros e visuais que ainda está ligado e operante, a fim de que o dono não esqueça de desligar tudo antes de travar o veículo. Por falar em avisos, um alerta sonoro externo emana do carro constantemente em velocidades até 25km/h para alertar pedestres e ciclistas, assemelhando-se a um protótipo de filme de ficção científica; acima disso, o único barulho que pode ser ouvido por fora é o do sistema de ar condicionado caso esteja em uso.

Bancos inteiriços mesclam couro e tecido com detalhes em creme e costura clara.

Percorridos os primeiros quilômetros, o e-Kwid agrada de cara por três pontos-chave. O primeiro é a leveza da direção elétrica que caiu como uma luva no subcompacto, deixando-o ainda melhor de ser conduzido. O segundo é o silêncio absoluto a bordo e o terceiro é a desenvoltura do motor elétrico que deixa o franco-romeno com um desempenho digno de carros turbinados; pisou, ele responde e avança sem pestanejar, deixando a condução bastante prazerosa.

Entretanto, quando o levamos para velocidades a partir dos 70 ou 80km/h, o comportamento fica bem mais pacato e o ruído de rodagem dos pneus começa a incomodar, lembrando-nos de que estamos em um veículo feito para as cidades. Algumas faltas bestas para um carro do seu preço também incomodam, bem como a ausência de certos recursos de comodidade que, por algum motivo, a Renault parece não gostar. Sensores crepuscular e de chuva, alças de teto e coisas do tipo, por exemplo, deveriam estar presentes.

Durante nossas pequenas viagens, conseguimos percorrer até 130km entre cidades gastando 45% de bateria, o que comprova que o e-Kwid também consegue ser utilizado com tranquilidade fora do ambiente urbano - desde que seja conduzido com calma e leveza, é claro. No cenário de maior gasto, utilizamos 63% de bateria para percorrer a mesma distância, porém, mantendo uma velocidade média mais alta - em outras palavras, exigindo mais do conjunto elétrico.

Uma dica rápida para identificar o e-Kwid nas ruas é observar a grade em preto brilhante com os detalhes cromados.

Avaliação geral

Design: olhando sem muita atenção, dificilmente um leigo saberá diferenciar o e-Kwid de um Kwid convencional pós-facelift. Isso é bom para quem preza pela discrição ao rodar nas ruas, contudo, é ruim para quem esperava um destaque maior devido ao preço elevado do elétrico quando comparado aos irmãos com motor a combustão. Independentemente da sua opinião, o fato é que a grande maioria aprovou as linhas do Kwid reestilizado e, por consequência, as da variante elétrica. Nós também gostamos. Nota: 9

Interior: quase todas as avaliações que você ver pela internet dirão que o acabamento do e-Kwid é melhor que o do Kwid padrão. Na verdade, ele não é melhor em qualidade ou textura, apenas um pouco mais bonito; tudo que é em plástico no Kwid convencional continua sendo em plástico no elétrico, o que significa que há plástico por todos os lados. As peças em cinza mais claro no painel e nas portas dianteiras ajudam a melhorar um pouco visualmente, além do volante exclusivo e a ausência dos pinos aparentes de trava nas portas dianteiras (ainda aparecem nas traseiras). Continua devendo alças de teto e puxadores nas portas para que os passageiros se segurem quando quiserem. Nota: 6

Mecânica: o motor elétrico do e-Kwid entrega um mínimo a menos de potência máxima e um mínimo a mais de torque máximo do que o 1.0 SCe flex que equipa o Kwid nacional - isso porque a divisão brasileira da Renault preparou um motor mais forte do que o utilizado no Dacia Spring original vendido na China, especialmente pensado para o uso tupiniquim. Parece ruim na teoria, mas, na prática, o e-Kwid dá um show de esperteza e surpreende positivamente. Infelizmente, nem ele escapou dos freios a disco somente na dianteira e da suspensão traseira por eixo de torção. Nota: 8

Tecnologia: dotado de itens indisponíveis nas versões comuns, o e-Kwid tenta agradar nesse aspecto e até que não é dos piores, porém, não traz nada de extraordinário diante de seu preço e, para piorar, deixa a desejar com faltas muito elementares e alguns cortes descarados de custos. Não dá para pedir quase 150 mil reais apenas com a promessa de uma vida útil mais econômica; é preciso entregar um pacote de recursos condizente. Nota: 5

Conveniência: basicamente, as mesmas queixas que fizemos sobre a versão Intense da linha 2023 valem para o e-Kwid. O elétrico melhora um pouco com detalhes como o botão de abertura do porta-malas direto na tampa e o ajuste mecânico de altura dos faróis, mas, continua devendo em detalhes muito básicos como a falta de mais luzes de cortesia, alças de teto, entre outros. Nota: 4

Acomodações: mais uma vez, as mesmas observações que fizemos sobre o Intense 2023 valem para o e-Kwid, portanto, nota igual. Nota: 6

Funcionalidades: tudo no e-Kwid funcionou como deveria durante todo o teste, sem bugs ou travamentos. Até mesmo as saídas de ar centrais, que nos incomodaram no teste com o Intense 2023, parecem bem melhores no elétrico. Nota: 10

Desempenho: se o Kwid padrão com seu modesto 1.0 SCe já consegue entregar um desempenho adequado ao seu preço e proposta, que dirá o e-Kwid. Ignore a ficha técnica e apenas dirija-o mesmo que por um trajeto curto, pois, o pequeno elétrico surpreende bastante - no bom sentido. Faz tudo o que se propõe sem pestanejar e também consegue manter um bom ritmo na estrada se necessário, embora, devido às peculiaridades de sua motorização específica, o ideal seja manter o pé tão leve no acelerador quanto for possível, a fim de garantir que você não fique sem carga no meio do caminho. Nota: 10

Segurança: o e-Kwid traz as mesmas boas novidades do Kwid 2023 nacional e agrega até mesmo airbags de cortina, um "luxo" que nem os irmãos Duster e Captur oferecem. Diante dos protocolos mais rígidos do Latin NCAP, é certo que o e-Kwid não tiraria nota máxima por não trazer nenhum recurso semiautônomo de segurança, mas, não acreditamos que o subcompacto zeraria por trazer reforços estruturais importantes em relação aos derivados oferecidos em outros países. Com essas incertezas, optamos por dar a mesma nota concedida ao modelo 2023 flex. Nota: 5

Custo X Benefício: por R$146.990, o e-Kwid é caro e barato ao mesmo tempo. Caro se comparado a carros normais, pois, seu preço o nivela a SUVs compactos turbinados, mas, barato se colocado contra outros elétricos que é, de fato, a análise que deve ser feita. Tendo o JAC E-JS1 e o CAOA Chery iCar como rivais diretos, as vantagens do e-Kwid são muito claras: dos três, é o que melhor equilibra desempenho e autonomia, o que possui a maior rede de concessionárias para necessidades diversas e, para terminar, o que traz o melhor espaço tanto para ocupantes quanto para bagagens. Ao nosso ver, o e-Kwid pode ser um ótimo negócio como segundo carro da casa, dedicado às movimentações urbanas diárias, pois, os custos de manutenção pelas revisões e de quilômetros rodados são muito inferiores aos de um carro com motor a combustão. Mesmo sendo um Kwid muito caro, ainda é um elétrico barato e isso deve ser levado em consideração. Nota: 7

Avaliação final: 70/100

Para-choque traseiro não é faceado com a tampa do porta-malas, ajudando a protegê-la.

Considerações finais

Como tudo que é novidade no mundo, leva algum tempo até que as coisas se adaptem e aquele algo novo já não seja encarado com estranheza ou, até mesmo, como um problema. Aos poucos, os carros elétricos estão deixando de ser exclusividade do mercado premium e alcançando as marcas generalistas com produtos muito semelhantes aos veículos com motores convencionais que já conhecemos, mas, ao analisarmos todo o cenário, os valores de compra e a limitação de pontos de recarga ainda se mostram os maiores obstáculos.

Com o e-Kwid, a Renault quer ajudar a democratizar a mobilidade eletrificada e esquecer o fiasco da época do Zoe, lançado no Brasil em 2021 e figurinha mais rara do que muitos superesportivos de milhões de reais. A favor do novo subcompacto temos a concorrência de preço semelhante e concepção inferior no geral, além do cenário mais favorável com novos pontos de recarga em inúmeras localidades e a conscientização coletiva de que o custo de uso de um elétrico é bastante inferior ao de um flex comum, mostrando que os modelos desse tipo são os caros que, no final das contas, saem mais baratos.


Concorrentes diretos: JAC E-JS1 e CAOA Chery iCar


Ficha técnica

Motor: um motor elétrico no eixo dianteiro
Potência máxima: 65cv
Torque máximo: 11,5kgfm
Bateria: 26,8kW
Autonomia: 298km (em ciclo urbano)
Transmissão: automática
Tração: dianteira
Suspensão: independente na dianteira, eixo de torção na traseira
Freios: discos ventilados na dianteira, tambores na traseira
Direção: elétrica
Pneus: 175/70 R14
Comprimento: 3,73m
Largura: 1,57m
Entre-eixos: 2,42m
Altura: 1,50m
Peso: 977kg
Porta-malas: 290l

0 a 100km/h: 14 segundos
Velocidade máxima: 130km/h (limitada eletronicamente)


Matéria em Vídeo



Fotos (clique para ampliar):